terça-feira, 8 de março de 2011

ROSTOS ENRUGADOS, ALMAS DE CRISTAL


"Nem a juventude sabe o que pode, nem a velhice pode o que sabe."
                                                                      
                                                                                          José Saramago




Ela voltou a abrir as janelas da casa, tirou os lençóis brancos que tinham ficado a cobrir os móveis.
Depois abriu a cristaleira e tirou os vidros todos cá para fora. Lavou e limpou copo por copo, olhando-se através da sua transparência. Muitos deles nunca tinham servido. Anos e anos ali dentro da cristaleira, alinhados nas prateleiras, passando da avó para a mãe e da mãe para ela, sempre com a mesma recomendação: “cuidado, é cristal, e o cristal é muito frágil, por isso estes copos não são para andar a uso”. Engraçado. O cuidado que se tem com objectos, com os copos de cristal, por exemplo, por que são frágeis, podem quebrar-se. E o pouco cuidado que se tem com as pessoas. Nunca se lembra de ter ouvido alguém dizer: “cuidado, é uma pessoa, e as pessoas são muito frágeis, e não podem andar a uso”.
Como é possível que as pessoas pensem tão pouco nas pessoas? E que depois de usadas – ah!, tão usadas que são as pessoas, tão usadas e estragadas! -, que depois de tudo sejam largadas em qualquer sítio, deitadas fora por já não valerem mais. Ninguém deita fora um copo de cristal, e quando se pega nele é com um cuidado imenso. Será que um copo de cristal é mais precioso que uma pessoa? Será que o copo de cristal se fez para estar numa prateleira sem ser usado, e uma pessoa se fez para ser usada até ao último cansaço, até o corpo se encher de rugas e os olhos ficarem baços e distantes?

Alice Vieira, ÁS DEZ A PORTA FECHA




O envelhecimento da população foi um dos temas discutidos  na unidade de formação 3.
Seguem-se excertos de trabalhos realizados por dois formandos.

Obrigada Pedro. Obrigada Sílvia.


"O envelhecimento é uma realidade a que não se pode fugir, é o destino, o fim do ciclo da vida. Sendo assim, não podemos mudá-lo nem contorná-lo, mas podemos atenuar ou proporcionar um envelhecimento saudável.
Ao nível político os nossos governantes têm um papel importante na fiscalização, criação e incentivo a melhores condições para os idosos ao nivel da saúde, pensões e actividades de lazer. Ainda existem muitos idosos espalhados pelo nosso país que vivem em locais bastante desconfortáveis e sem o mínimo de condições. Hoje, os lares e algumas associações são as verdadeiras ajudas de que estas pessoas dispõem quer ao nível de domicilio quer de internato.

Ainda há pouco verificámos nos telejornais uma notícia que dizia que uma idosa estava desaparecida há oito anos e passados estes foi encontrada morta na sua casa. Como é que isto é possível? Esta senhora não tinha família... Por que é que as autoridades não foram a sua casa? Como será possível uma pessoa estar desaparecida e ninguém ir a sua casa?
Acho que o principal problema está nas pessoas, porque são as pessoas que actuam, fazem as leis, tomam as decisões. Por isso afirmo que o principal factor que tem a capacidade de alterar todas as injustiças de que são alvo os idosos, somos nós, cidadãos que nos encontramos no activo, participando em actividades de voluntariado, principalmente para com aqueles que necessitam, principalmente dando toda a atenção aos nossos, aqueles que temos lá em casa ou na nossa família e que por vezes esquecemos.

O apelo ou a mensagem que quero que fique patente neste trabalho é que devemos dar todo o carinho e amor aos nossos"velhotes" porque eles também o deram quando nós eramos mais pequenos. Hoje são eles os "mais pequenos". É de respeitar que alguns familiares tenham de deixar essas pessoas à guarda de algumas instituições pois as suas condições de vida não lhes permitem dar um melhor conforto a estes, mas nunca poderão esquecer-se deles.
Por isto, quero alertar para o facto de que a solução para proporcionar um envelhecimento saudável e digno para quem já contribuíu na sua quota parte para a sociedade e para o que somos hoje, está no nosso comportamento.
Temos que ser mais humanos, mais compreensivos e, acima de tudo, temos que amar porque também somos amados."

Pedro Cabrita (EFA NS)




É na velhice que o idoso quer amor, carinho dos seus; o cuidado e a presença de quem gosta de modo a partilhar as suas experiências e conhecimentos da vida. Se o idoso não tem convivência com a família nem com os amigos, ele não encontra razão para sua existência. Muitos são abandonados no hospital ou em lares. Já bastava as limitações do corpo, a vitalidade não ser a mesma, os movimentos mais lentos, o raciocínio próprio da idade, a desconsideração da sociedade e a indiferença de todos. Tudo isto leva o idoso a sentir-se inútil. É uma altura de grandes mudanças, e muitas delas com um fim próximo em que devemos dar mais atenção aos mais velhos, o tempo anda rápido e muito pode ficar por fazer. A solidão e o isolamento de tudo, os maus tratos levam o idoso por vezes a entrar em depressão. Se estiver doente, o seu pensamento é que a morte venha rápido, para não sofrer, e para estar só, estará no céu junto dos seus. “Por que é  que eu estou aqui?”são pensamentos que levam ao suicídio ou a desejar que a eutanásia seja legal.  Mas acredito que tudo se pode resolver, mesmo quando a morte é um fim anunciado.
 Há que ocupar o tempo disponível com actividades, exercícios físicos, integração na sociedade, a partilha de saberes de modo a que a velhice tenha o respeito que merece como ser humano. E se perdemos tudo, então vamos viver por nós, li “que viver implica manter-se num processo de aprendizagem eterno” e concordo velho não quer dizer acabado, mas sim uma nova transformação da vida. A hora do merecido descanso com a reforma, há-que aproveitar para realizar sonhos e formar os mais novos para as dificuldades da vida. Compensar quem é solidário com os idosos.

Sílvia Correia (EFA NS)

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